Em 2023, o governo brasileiro estabeleceu o Plano de Ação para a criação da Taxonomia Sustentável Brasileira (MF 2023a). A Taxonomia tem como objetivo estabelecer um sistema de classificação padronizado e de vigência nacional para determinar investimentos sustentáveis para diferentes atividades econômicas, ativos financeiros e projetos. O Plano foi elaborado usando como referência iniciativas domésticas e internacionais de finanças sustentáveis, bem como compromissos internacionais e legislações nacionais já estabelecidas.
Objetivos
O Plano de Ação para a Taxonomia Sustentável Brasileira estabelece uma série de objetivos organizados em dois principais grupos: (i) ambiental e climático e (ii) econômico e social, como mostra a Tabela 1. Em comparação com outras taxonomias, a seleção de objetivos do Plano é mais ambiciosa tanto em relação à quantidade quanto à própria redação, muitas vezes mais ampla do que o que é estabelecido por outros países, como é o caso dos objetivos relacionados à geração de trabalho decente e elevação de renda e à redução de desigualdades socioeconômicas e regionais. Dentre os objetivos elencados, o MF estabeleceu como prioritários para elaboração dos critérios os objetivos de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, uso sustentável do solo e conservação, manejo e uso sustentável das florestas, e redução das desigualdades (MF 2023c).
O objetivo de adaptação climática deverá ser priorizado para o setor da agricultura, considerando as potenciais perdas no setor advindas das mudanças climáticas (MF 2023d). De fato, esse setor, fundamental para a garantia da soberania alimentar brasileira e global, tem uma alta exposição a riscos climáticos e socioambientais, que afetam a produtividade agrícola, ameaçando renda e emprego.
Princípios
Os princípios que orientarão o desenho da Taxonomia Sustentável Brasileira são:
- Base científica (para elaboração dos critérios);
- Critérios técnicos (quantitativos, sempre que possível);
- Impactos sobre o ciclo de vida da atividade;
- Coerência (com objetivos, legislações e compromissos);
- Consistência (entre metodologias empregadas para os diferentes setores);
- Proporcionalidade (requisitos diferenciados de acordo com o porte da organização);
- Usabilidade/aplicabilidade (balanço entre complexidade necessária para transição e simplicidade para garantir sua viabilidade);
- Ferramenta evolutiva (revisão periódica dos critérios);
- Previsão de atividades de transição (para as quais não existem alternativas viáveis de zero emissão);
- Previsão de atividades viabilizadoras (necessárias para viabilizar atividades elegíveis, como é o caso da assistência técnica).
Além desses princípios, o Plano de Ação ressalta também a interoperabilidade, ou seja, os critérios definidos devem ter equivalência e comparabilidade com taxonomias internacionais.[1]
Critérios
A conformidade de um ativo, projeto ou investimento à Taxonomia ocorrerá, segundo o Plano de Ação, se a atividade econômica atender simultaneamente aos seguintes critérios gerais:
- Contribuir substancialmente a um ou mais dos objetivos definidos;
- Não causar dano significativo a nenhum dos outros objetivos definidos;
- Cumprir com as salvaguardas mínimas listadas no plano.[2]
Em relação aos critérios específicos previstos para atender ao objetivo de uso sustentável do solo e conservação, manejo e uso sustentável das florestas, o Plano de Ação menciona que a classificação poderá ser não binária, ou seja, com gradações, diferentemente do previsto para as demais atividades. Para tal, o Plano de Ação destacou os exemplos das Taxonomias Colombiana e Mexicana que definem três níveis de cumprimento: atividades básicas, intermediárias e avançadas. O Plano ainda sugere o uso de metodologias da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para embasar a definição de categorias de sustentabilidade aplicáveis ao setor. Essas iniciativas serão apresentadas e discutidas neste documento.
Os setores econômicos para os quais a Taxonomia se aplica são delimitados conforme o Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).[3] O Plano de Ação prevê a constituição de grupos técnicos setoriais compostos por órgãos do governo para a definição dos critérios de cada setor. Serão também constituídos dois grupos temáticos: o de enfrentamento das desigualdades e o de monitoramento, relato e verificação. É importante mencionar que este último grupo foi pensado para identificar as melhores práticas na mensuração e certificação de impacto, com os objetivos de (i) desenvolver uma metodologia de relato que facilite a verificação, a comparabilidade e a comunicação simples e (ii) criar uma plataforma de monitoramento com informações sobre os recursos alocados para atividades e projetos sustentáveis, segundo uma série de aspectos, como fonte de recurso, setor, região, entre outros.
O Plano de Ação prevê que a verificação da Taxonomia deverá ser feita primeiro no nível das atividades individuais, mas, em alguns casos, também no nível da organização, de modo a identificar possíveis danos gerados por outras atividades. No caso das atividades de uso da terra, isso pode ser interpretado como uma observância dos critérios da Taxonomia no empreendimento em si (que pode ser um projeto, atividade ou a compra de um ativo, por exemplo) ou da propriedade rural como um todo. A Taxonomia irá prever a participação de certificações ou auditorias realizadas por outras entidades nesse processo.
Tabela 1. Comparação de Objetivos das Taxonomias Analisadas
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de MF (2023a); CBI (2023a); Regulamento UE nº 2020/852; Gobierno de Colombia (2022); SHCP (2023) e Febraban (2021), 2024
[1] Sobre a importância da cooperação internacional nesse contexto, ver: Fronda, Aaran. “A importância da cooperação mundial em Taxonomias verdes”. Bloomberg. 2023. Data de acesso: 27 de fevereiro de 2024. bit.ly/4c9skcu.
[2] Salvaguardas são critérios que precisam ser cumpridos por todas as atividades para serem consideradas elegíveis a uma categoria na Taxonomia. Segundo o Plano de Ação (MF 2023a, p. 40), “as salvaguardas serão definidas por legislações e normas brasileiras existentes, e por convenções e diretrizes internacionais, relacionados em particular a questões de direitos humanos e diretos trabalhistas, além de questões de transparência”.
[3] A contribuição deste documento faz parte do setor A: Agricultura, Pecuária, Produção florestal, Pesca e Aquicultura.