O alcance da meta da NDC brasileira depende do aprimoramento da linha de crédito ABC Recuperação
O novo estudo do Climate Policy Initiative/PUC-Rio (CPI/PUC-Rio) aponta que o crédito para recuperação de pastagens degradadas no Cerrado tem sido pouco efetivo. Quase 3/4 das áreas analisadas permanecem inalteradas quatro anos após a tomada do crédito. Em média, o crédito reduz a área de pastagem em 3 pontos percentuais, mas o estudo não identificou efeitos significativos da tomada de crédito em áreas severamente degradadas.
“Analisando as áreas que receberam os investimentos para recuperação de pastagens, observamos que a tomada do crédito não está gerando um aumento relevante da qualidade geral das pastagens e não tem provocado mudanças significativas no uso da terra. Os recursos subsidiados não estão gerando retornos efetivos para a sociedade.”, diz Wagner Oliveira, analista sênior do CPI/PUC-Rio.
Cerca de 2/3 das pastagens brasileiras estão degradadas, o que corresponde a 100 milhões de hectares. O ABC Recuperação é o principal instrumento de política pública implementado nos últimos anos para recuperação de pastagens. Entretanto, a linha de crédito ABC Recuperação contribuiu para, no máximo, 2,5% da meta do Plano ABC de recuperação de 15 milhões de hectares até 2020. Ainda que 100% das áreas de pastagem declaradas nas operações de crédito ABC Recuperação fossem recuperadas, a contribuição dessa linha de crédito para a meta do Plano ABC teria sido de 18%.
O estudo demonstra também que as áreas destinadas aos investimentos de recuperação de pastagem foram parcialmente desmatadas para uso agropecuário, com uma redução média de 5 pontos percentuais na proporção de vegetação nativa ao longo dos seis anos anteriores à obtenção do crédito. Após o crédito, essa tendência foi interrompida.
“As evidências mostram uma contradição com o próprio objetivo da recuperação de pastagens de evitar novos desmatamentos e emissões de gases de efeito estufa. É preciso avaliar melhor as áreas declaradas antes da liberação dos recursos e focalizar o crédito para produtores que adotam boas práticas. Além disso, precisamos aprimorar o monitoramento das áreas após a liberação do crédito, acompanhando o cumprimento do projeto técnico.”, afirma Oliveira.
Para os autores do estudo, o aumento da efetividade do programa depende da associação com outros instrumentos de política pública, como a assistência técnica. “Os tomadores de crédito que utilizaram os recursos para contratar assistência tiveram redução de 6 pontos percentuais da área de pastagem degradada. No caso dos produtores que não contrataram o serviço, o vigor das pastagens foi praticamente inalterado.”, explica Priscila Souza, gerente sênior de avaliação de política pública do CPI/PUC-Rio.
Souza sugere também a associação do crédito com instrumentos de gerenciamento de risco. “Aumentar a disponibilidade de apólices de seguro rural com prazo mais prolongado pode ampliar os impactos e minimizar a influência negativa de riscos que estão fora do controle do produtor.”, destaca.
O Brasil assumiu o compromisso de recuperar 30 milhões de hectares de pastagem até 2030 em sua NDC. Em 2023, o Ministério da Agricultura e Pecuária lançou o Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas em Sistemas de Produção Agropecuários e Florestais Sustentáveis (PNCPD), com o objetivo de recuperar e converter 40 milhões de hectares de pastagem.
“A ampliação dos recursos para recuperação de pastagens precisa ser acompanhada de maior efetividade dos investimentos, de modo a alcançar a meta nacional e aumentar a contribuição brasileira no pacto global de enfrentamento à crise climática. O Brasil precisa equilibrar o crescimento da produção agropecuária com a preservação da vegetação nativa. Neste momento em que o Brasil se prepara para apresentar sua nova NDC, temos a oportunidade de aprimorar a política de crédito subsidiado.”, destaca Juliano Assunção, diretor executivo do CPI/PUC-Rio.
No estudo, os pesquisadores cruzaram os polígonos georreferenciados das operações de crédito rural do Banco Central do Brasil entre 2016 e 2018 com dados sobre uso da terra e vigor de pastagens da Plataforma MapBiomas e do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) da Universidade Federal de Goiás (UFG), analisando os efeitos na recuperação de pastagens até 2022.
Acesse o estudo completo: bit.ly/RecuperacaoDePastagens
Sobre o Climate Policy Initiative/PUC-Rio
O Climate Policy Initiative (CPI) é uma organização com experiência internacional em análise de políticas públicas e finanças, que possui sete escritórios ao redor do mundo. No Brasil, é afiliado a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). O CPI/PUC-Rio atua no aprimoramento de políticas públicas e financiamento climático no Brasil através de análises baseadas em evidência e parcerias estratégicas com membros do governo, da sociedade civil, do setor privado e de instituições financeiras.
Para mais informações, entre em contato com:
Camila Calado Lima
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