No Brasil, o Estado desempenha papel fundamental na proteção da Floresta Amazônica. Por um lado, diversos órgãos governamentais são responsáveis tanto por administrar as terras públicas destinadas quanto por arrecadar e destinar áreas sem definição fundiária específica. Por outro, o poder público é também responsável pela implementação do Código Florestal, lei que determina as regras para a conversão de vegetação nativa e uso do solo em terras privadas no bioma Amazônia.
Políticas públicas são, portanto, indispensáveis para frear a recente aceleração do desmatamento e reverter a tendência de crescimento observada ao longo da última década (Figura 1).[1] Contudo, em um contexto de recursos sabidamente escassos para a execução dessas políticas, é estratégico focalizar esforços públicos em áreas com maior potencial de impacto. Neste estudo, pesquisadores do Climate Policy Initiative/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio) partem de um recorte fundiário do bioma Amazônia para identificar essas áreas críticas, dedicando particular atenção à esfera do poder público que atua em cada território. A análise identifica três frentes de ação prioritárias.
O governo federal deve priorizar o combate ao desmatamento em assentamentos rurais, conciliando a proteção florestal com a garantia dos meios de vida das populações assentadas. Já os governos estaduais têm na implementação do Código Florestal seu principal aliado para combater o desmatamento em áreas privadas. Esse esforço estadual pode — e deve — contar com o apoio do governo federal. Além disso, União e estados devem atuar, de forma complementar e coordenada, para promover o ordenamento territorial de áreas públicas não destinadas e áreas sem informação fundiária. Esses territórios têm sido alvo de ocupações ilegais associadas à destruição florestal. É imprescindível que o poder público arrecade, cadastre, regularize e destine essas áreas.
Os resultados salientam a importância de haver coordenação e cooperação entre as esferas federal e estadual a fim de assegurar uma proteção efetiva da Floresta Amazônica.
Figura 1. Desmatamento no Bioma Amazônia, 2012 – 2021
Nota: O gráfico apresenta o total de área desmatada a cada ano dentro do bioma Amazônia. Destaca-se que esse total difere da taxa de desmatamento para a Amazônia Legal. Além disso, a prévia da taxa de desmatamento para a Amazônia Legal referente ao ano-PRODES 2022, divulgada no dia 30/11/2022, foi de 11.568 km². Os dados espaciais para esse ano ainda não estão disponíveis e, portanto, não puderam ser incorporados nesta análise.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de PRODES/INPE, 2022
Estrutura Fundiária do Bioma Amazônia
A partir das categorias fundiárias, essa análise classifica o território do bioma Amazônia em áreas públicas federais, públicas estaduais, privadas, sem informação fundiária e outras. A Figura 2 apresenta como essas áreas se distribuem entre as categorias fundiárias, que são brevemente descritas no Glossário de Categorias Fundiárias do Bioma Amazônia.[2] Já a Figura 3 exibe a composição dos estados do bioma por tipo de área.
A situação fundiária da Amazônia brasileira é sabidamente complexa. As bases de dados atualmente disponíveis carregam inconsistências e revelam expressiva sobreposição entre as áreas registradas nos diversos cadastros fundiários do país. O tratamento dado a tais inconsistências e sobreposições é determinante para a construção de um mapa fundiário e, consequentemente, para o cálculo de áreas a ele associado.
Como o objetivo desta análise é identificar territórios prioritários para atuação do poder público — e não fazer um mapeamento fundiário —, o estudo utiliza a Malha Fundiária do Brasil,[3] versão de 2021, como principal fonte de informação. Elaborada pelo Imaflora e pelo GeoLab da ESALQ/USP, a malha é construída a partir de cadastros fundiários que dispõem de dados espacialmente explícitos. A nota metodológica deste documento discute o uso de fontes de informação adicionais e o tratamento dos dados espaciais.
Figura 2. Composição Fundiária do Bioma Amazônia, 2021
Nota: O bioma Amazônia ocupa 4,2 milhões km². Os números no gráfico indicam o percentual do bioma referente a cada tipo de área e categoria fundiária. O diagrama não contempla assentamentos rurais e unidades de conservação sob responsabilidade municipal e tampouco assentamentos rurais para os quais não foi possível determinar a esfera governamental responsável. Juntos, esses territórios representam menos de 0,02% da área do bioma Amazônia.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA e Incra, 2022
Figura 3. Composição dos Estados no Bioma Amazônia por Tipos de Área, 2021
Nota: A análise contempla apenas as parcelas dos territórios estaduais que estão dentro do bioma Amazônia.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA e Incra, 2022
Desmatamento por Tipo de Área
A distribuição do desmatamento entre áreas públicas e privadas no bioma Amazônia pouco se alterou ao longo da última década. A perda florestal ocorreu principalmente em áreas públicas federais e áreas privadas, que, respectivamente, concentraram 45% e 28% da área desmatada no período. O desmatamento totalizou mais de 55 mil km² nesses territórios.
Houve, contudo, um aumento importante no nível de desmatamento observado principalmente em áreas públicas federais e áreas sem informação fundiária em anos recentes. Entre 2018 e 2021, a área desmatada nesses territórios aumentou 91% e 74%, respectivamente. Para fins de comparação, durante o mesmo período, apesar de ainda concentrarem grande área desmatada, as áreas privadas viram um aumento do desmatamento de 58%.
Os padrões retratados indicam que, em termos de escala, a prioridade para combate ao desmatamento em terras públicas está em territórios federais. Já o escopo para maior impacto da atuação estadual encontra-se em áreas privadas. Ressalta-se que os estados detêm a responsabilidade de implementar o Código Florestal, o principal instrumento legal para a proteção florestal em imóveis privados. Além disso, cabe ao poder público, tanto federal quanto estadual, promover o ordenamento territorial em áreas sem informação fundiária como uma forma de combater a perda florestal nesses territórios.
Considerando que os estados têm estruturas fundiárias diferentes, é esperado que os padrões de desmatamento difiram entre eles. Nota-se que a perda florestal em terras públicas federais é particularmente expressiva no Pará e no Amazonas, mas ela também apresenta sinais de aceleração recente no Acre e em Rondônia. O desmatamento em áreas sem informação fundiária está concentrado no Pará, no Mato Grosso e em Rondônia. Já o desmatamento em áreas privadas está distribuído principalmente entre quatro estados (Pará, Mato Grosso, Amazonas e Rondônia), com concentração da área desmatada no Mato Grosso e no Pará e notável aceleração recente no Pará e no Amazonas. Os estados do Amapá, Maranhão e Tocantins não apresentam níveis relevantes de desmatamento no período, pois detêm pouca vegetação nativa tropical e ocupam territórios relativamente pequenos dentro do bioma Amazônia.
Para aprofundar a compreensão sobre áreas críticas para o combate ao desmatamento, a análise explora as trajetórias de perda florestal por categoria fundiária olhando separadamente para áreas públicas federais, áreas públicas estaduais, áreas sem informação fundiária e áreas privadas. Para cada um desses tipos de área, apresenta as trajetórias detalhadas referentes aos estados do Acre, Amazonas, Mato Grosso, Pará e Rondônia. Conjuntamente, esses cinco estados responderam por 95% da área desmatada dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021.
Figura 4. Desmatamento no Bioma Amazônia por Estado e Tipo de Área, 2012 – 2021
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA,
Incra e PRODES/INPE, 2022
Áreas públicas federais
Os assentamentos rurais concentraram 54% do desmatamento em áreas públicas federais entre 2012 e 2021, com quase 45% da perda florestal da categoria ocorrendo no Pará. Além de afetar áreas extensas, o desmatamento nesses territórios avança a uma velocidade acelerada. A partir de 2019, houve expressivo crescimento da perda florestal em assentamentos no Pará, mas também no Acre e no Amazonas. Uma estratégia de desenvolvimento sustentável para a região amazônica precisa alinhar a promoção do desenvolvimento social e econômico dos assentados com a proteção da floresta nos assentamentos federais.
Após os assentamentos, os territórios que mais concentraram desmatamento em áreas públicas federais foram as florestas públicas que ainda não receberam destinação para uso específico. Quase 80% dos seus 101,7 mil km² estão registrados como imóveis privados no SICAR, um indício de ocupação ilegal. Foram justamente essas áreas ocupadas que concentraram 91% do desmatamento ocorrido nessa categoria fundiária entre 2012 e 2021. A perda florestal em florestas públicas federais não destinadas, que apresentava tendência de crescimento desde o início do período de análise, teve forte aceleração a partir de 2019. Trajetória semelhante, ainda que menos acentuada, foi observada nos territórios contemplados, mas não titulados, pelo programa Terra Legal, encerrado em 2018. Essas áreas tipicamente já contêm algum grau de ocupação, uma vez que constavam do programa federal de titulação de terras. O desmatamento em florestas públicas federais não destinadas e em áreas do programa Terra Legal que não foram tituladas concentra-se principalmente no Pará e, em menor escala, no Amazonas e em Rondônia.
Os resultados salientam a importância de focalizar esforços de combate ao desmatamento em áreas públicas federais com maior fragilidade de direitos fundiários. Considerando que essas áreas já estão ocupadas, ainda que parcialmente, é imprescindível que as medidas de proteção florestal sejam acompanhadas de ações tanto de ordenamento territorial, para destinação das áreas não destinadas, quanto de regularização fundiária.
Destaca-se, ainda, que a perda florestal em terras indígenas e unidades de conservação de uso sustentável federais cresceu nos últimos anos. Esse aumento se deu predominantemente no estado do Pará, mas também se manifestou em unidades de conservação de uso sustentável no Acre e em terras indígenas no Mato Grosso. Apesar de representar uma parcela relativamente baixa do desmatamento em áreas públicas federais, o avanço da área desmatada nesses territórios protegidos serve como um alerta para que autoridades federais atuem para assegurar a efetividade da proteção legal.
Figura 5. Desmatamento em Áreas Públicas Federais do Bioma Amazônia por Estado e Categoria Fundiária, 2012 – 2021
Nota: São retratadas apenas as trajetórias referentes aos cinco estados que, conjuntamente, responderam por 95% da área desmatada dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA, Incra e PRODES/INPE, 2022
Áreas Públicas Estaduais
O desmatamento em áreas públicas estaduais ocorre em menor escala do que em áreas federais. No entanto, o padrão de perda florestal observado em áreas estaduais sem destinação específica é semelhante àquele visto na categoria análoga federal. As florestas públicas não destinadas responderam por 52% do desmatamento em áreas estaduais entre 2012 e 2021, apresentando nítida aceleração da perda florestal a partir de 2019. Há indícios de que, assim como no caso federal, as áreas não destinadas têm sido alvo de ocupações. Os registros de imóveis privados no SICAR ocupam quase 12% dos 304 mil km2 de florestas públicas estaduais não destinadas e respondem por 60% do desmatamento ocorrido na categoria fundiária durante o período de análise. Isso reforça a importância de se avançar com o combate à grilagem e com a destinação dessas florestas também na esfera estadual.
Acre, Amazonas e Pará concentraram o desmatamento em florestas públicas estaduais não destinadas entre 2012 e 2021, mas o Amazonas desponta como o estado com maior nível recente de desmatamento na categoria fundiária. Isso é particularmente relevante à luz da discussão sobre os possíveis impactos de obras de infraestrutura na região, como a rodovia BR-319, cuja reconstrução pode afetar extensa área de floresta pública não destinada no estado.[4]
A segunda trajetória que se destaca em áreas públicas estaduais diz respeito ao desmatamento em unidades de conservação de uso sustentável, que representa 40% da perda florestal em áreas estaduais durante o período da análise. Contudo, a maior parte dessa perda está concentrada em Rondônia, indicando que os estados precisarão adotar estratégias diferentes para atuação local.
Figura 6. Desmatamento em Áreas Públicas Estaduais do Bioma Amazônia por Estado e Categoria Fundiária, 2012 – 2021
Nota: São retratadas apenas as trajetórias referentes aos cinco estados que, conjuntamente, responderam por 95% da área desmatada dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA, Incra e PRODES/INPE, 2022
Áreas sem Informação Fundiária
O desmatamento nas áreas sem informação fundiária representou 21% da perda florestal entre 2012 e 2021, com clara aceleração a partir de 2019. Quase metade dessa perda ocorreu em áreas registradas exclusivamente no SICAR. Em 2021, 53% da área registrada já havia sido desmatada. Ainda que o Pará e o Mato Grosso concentrem a maior parte do desmatamento em áreas sem informação fundiária, as tendências de aumento recente observadas no Acre, no Amazonas e em Rondônia evidenciam que não se trata de uma questão restrita a uma só região.
A existência de registros do SICAR em áreas sem informação fundiária serve como um indício de ocupação de áreas públicas e reforça a importância de se avançar com o ordenamento territorial. Não é possível estabelecer responsabilidade específica em territórios que não constam de cadastros fundiários.[5] É preciso que o poder público aja para arrecadar e destinar áreas não cadastradas, assim como identificar ocupações passíveis de regularização fundiária. O ordenamento territorial da Amazônia não é apenas uma forma de combater a insegurança fundiária no bioma, mas também de proteger a floresta.
Figura 7. Desmatamento em Áreas Sem Informação Fundiária do Bioma Amazônia por Estado e Categoria Fundiária, 2012 – 2021
Nota: São retratadas apenas as trajetórias referentes aos cinco estados que, conjuntamente, responderam por 95% da área desmatada dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA, Incra e PRODES/INPE, 2022
Áreas Privadas
Responsáveis por 28% de toda a área desmatada no bioma Amazônia entre 2012 e 2021, os imóveis privados são críticos para o combate ao desmatamento. Apesar de crescer desde 2012, a perda florestal nessas áreas acelerou a partir de 2019. Essa aceleração foi vista nos estados do Acre, Amazonas, Pará e Rondônia. O Mato Grosso difere dos demais estados por apresentar clara concentração de área desmatada em imóveis grandes e crescimento desse desmatamento desde o início do período de análise.
As trajetórias apresentadas retratam o avanço anual do desmatamento, mas a análise também calculou a extensão da perda florestal acumulada até 2021 em relação à área total ocupada por imóveis privados no bioma Amazônia. Já foram desmatados 67% do território ocupado por imóveis pequenos, 45% dos médios e 33% dos grandes. Para além de revelar a magnitude da perda florestal que já ocorreu dentro de áreas privadas no bioma Amazônia, os resultados reforçam a urgência de parar o desmatamento nessas áreas. Para tal, é fundamental que o poder público avance com a implementação do Código Florestal, principal instrumento de política pública para proteção da vegetação nativa em terras privadas.
O Código Florestal é uma legislação federal, mas são os estados os responsáveis por sua implementação. São também eles que detêm a competência primeira de fiscalizar e aplicar a lei em áreas privadas, pois são responsáveis pelo licenciamento ambiental nessas áreas. A atuação da União em áreas privadas deveria ocorrer de forma coordenada com o poder público estadual.[6]
Dada a magnitude do desmatamento em áreas privadas e considerando a responsabilidade que os estados têm quanto à execução do controle ambiental nessas áreas, é imperativo que o poder público estadual priorize a implementação do Código Florestal.[7] Vale notar que o governo federal desempenha um papel central de apoio aos governos estaduais nessa agenda. Exemplos da atuação federal para avançar a implementação do Código Florestal incluem o desenvolvimento e a gestão do SICAR, assim como a elaboração de ferramentas e a provisão de insumos críticos para apoiar a implementação do CAR em âmbito estadual. A coordenação entre os governos federal e estadual é, assim, fundamental para lutar contra o desmatamento na região.
Figura 8. Desmatamento em Áreas Privadas do Bioma Amazônia por Estado e Tamanho do Imóvel, 2012 – 2021
Nota: São retratadas apenas as trajetórias referentes aos cinco estados que, conjuntamente, responderam por 95% da área desmatada dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021.
Fonte: CPI/PUC-Rio com base nos dados de IBGE, Imaflora e GeoLab, CNFP/SFB, CNUC/MMA, Incra e PRODES/INPE, 2022
Implicações para a política pública
Políticas públicas são imprescindíveis para combater o desmatamento na Amazônia. A coordenação entre os entes responsáveis por executar essas políticas é essencial para explorar complementariedades e, assim, potencializar a efetividade da atuação do poder público.
O padrão de ocorrência do desmatamento por categoria fundiária ao longo da última década aponta para ações prioritárias. A União deve priorizar o desenvolvimento de uma estratégia para assentamentos rurais, conciliando a proteção florestal com a viabilidade socioeconômica desses territórios. Já os estados, com apoio do governo federal, devem priorizar a implementação do Código Florestal, incluindo a validação de registros do CAR como ferramenta crítica de monitoramento.
É também importante avançar o ordenamento territorial, o que inclui arrecadar áreas não cadastradas, retomar o controle de áreas públicas que foram ilegalmente ocupadas, promover a regularização fundiária e destinar áreas sem destinação. Um esforço que demanda a atuação conjunta entre as esferas federal e estadual.
A análise utiliza um conjunto de informações fundiárias para elaborar estratégias de priorização para a atuação do poder público, visando potencializar seu impacto e sua efetividade. Considerando a complexidade da situação fundiária na Amazônia e as muitas fragilidades do conjunto de dados atualmente disponíveis sobre o tema, não é possível identificar de forma inequívoca a estrutura fundiária de todo o bioma. Diferentes métodos geram, portanto, diferentes números. Melhorar a qualidade dos dados públicos e a integração entre eles é também responsabilidade do poder público e um passo fundamental em direção à maior transparência da informação.
Nota metodológica
A análise apresenta a trajetória da área desmatada a cada ano dentro do bioma Amazônia entre 2012 e 2021 (último ano para os quais os dados espacialmente explícitos de desmatamento estão disponíveis), considerando a categoria fundiária na qual a perda florestal ocorreu. As áreas de cada categoria são classificadas conforme os seguintes cinco tipos: pública federal; pública estadual; sem informação fundiária; privada; outras.
A área desmatada é calculada a partir do dado espacialmente explícito (formato vetorial) do PRODES/INPE, que fornece o histórico oficial do desmatamento na Amazônia brasileira.[8] A categoria fundiária de cada área é identificada a partir de uma combinação de fontes de dados. A Malha Fundiária do Brasil, versão de 2021, realizada pelo Imaflora e pelo GeoLab da ESALQ/USP,[9] serve como a principal fonte para informação fundiária. Categorias fundiárias associadas a um único tipo de área são classificadas conforme a malha fundiária original. Exemplos incluem terras indígenas, que são áreas públicas federais, e imóveis privados, que são áreas privadas. A Malha Fundiária do Brasil não permite, contudo, distinguir entre áreas federais e estaduais para categorias fundiárias que contemplam áreas de diferentes tipos. Nesses casos, a informação foi complementada com dados do Serviço Florestal Brasileiro (florestas públicas tipo-B),[10] CNUC (unidades de conservação)[11] e Incra (assentamentos rurais).[12]
Há expressiva sobreposição entre categorias fundiárias na Amazônia brasileira. Para resolver essas inconsistências, a Malha Fundiária do Brasil define e aplica uma hierarquia entre as categorias fundiárias.[13] Esta análise adota uma versão ligeiramente modificada dessa mesma hierarquia. A única alteração é que imóveis rurais cadastrados no SICAR não têm prioridade sobre florestas públicas tipo-B. Logo, em caso de sobreposição entre essas categorias, o cadastro privado é descartado e a área é considerada floresta pública não destinada. A análise usa esse procedimento para calcular a extensão da ocupação de áreas de floresta pública não destinada.
Os autores gostariam de agradecer a Patrick Aleixo e Marcelo Sessim pela assistência de pesquisa; Juliano Assunção, Cristina Leme Lopes, Joana Chiavari e participantes do Projeto Amazônia 2030 pelos comentários; Natalie Hoover, Giovanna de Miranda e Camila Calado pela revisão de texto; e Nina Oswald Vieira e Julia Berry pelo trabalho de design gráfico.
[1] A análise abrange o período 2012 a 2021, mas os anos referem-se ao chamado “ano-PRODES”, período de 12 meses utilizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) para registro do desmatamento anual. Por exemplo, o ano-PRODES 2021 contempla o desmatamento que ocorreu entre agosto de 2020 e julho de 2021. Destaca-se que a prévia da taxa de desmatamento para a Amazônia Legal referente ao ano-PRODES 2022, divulgada no dia 30/11/2022, foi de 11.568 km². Os dados espaciais para esse ano ainda não estão disponíveis e, portanto, não puderam ser incorporados nesta análise.
[2] Para uma discussão detalhada sobre as categorias fundiárias brasileiras, ver Chiavari, Joana, Cristina L. Lopes e Julia N. de Araujo. Panorama dos Direitos de Propriedade no Brasil Rural. Rio de Janeiro: Climate Policy Initiative, 2021. bit.ly/PanoramaRural2021.
[3] Imaflora e Geolab. Atlas da Agropecuária Brasileira. bit.ly/3Ofa7yR. Data de acesso: 30 de setembro de 2022.
[4] Araujo, Rafael, Arthur Bragança e Juliano Assunção. Acessibilidade na Amazônia Legal: Delimitação da Área de Influência e Riscos Ambientais. Amazônia 2030, 2022. bit.ly/AMZInfluenciaERiscos.
[5] O CAR é um instrumento de controle ambiental que não reflete direitos fundiários.
[6] A Constituição Federal de 1988 prevê ser de competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios a proteção do meio ambiente e a preservação das florestas, da fauna e da flora. Historicamente, o controle ambiental na Amazônia era executado principalmente por órgãos federais. Isso mudou em 2011, quando a Lei Complementar nº.140/11 fixou as normas referentes à cooperação entre os entes federativos, inclusive a União e os estados, para ações administrativas de proteção do meio ambiente e preservação das florestas, da fauna e da flora. Dentre as normas fixadas, consta a definição de que o ente que licencia detém a competência primeira de fiscalizar e aplicar a lei ambiental. Com isso, os estados passaram a ser os principais responsáveis por aplicar a lei referente à supressão de vegetação nativa em áreas privadas, pois são eles que emitem as licenças para essa supressão. A atuação do poder público federal dentro dessas áreas deve, portanto, ser feita de forma coordenada com o poder público estadual.
[7] Para mais detalhes sobre o Código Florestal e sua implementação, ver: Climate Policy Initiative. Monitor da Implementação do Código Florestal. 2022. bit.ly/MonitordeImplementacaoCF.
[8] Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). PRODES – Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite. bit.ly/3xEMgQ0. Data de acesso: 07 de julho de 2022.
[9] Imaflora e Geolab. Atlas da Agropecuária Brasileira. bit.ly/3Ofa7yR. Data de acesso: 30 de setembro de 2022.
[10] Serviço Florestal Brasileiro (SFB). Cadastro Nacional de Florestas Públicas. bit.ly/3hTwRIx. Data de acesso: 29 de setembro de 2022.
[11] Ministério do Meio Ambiente (MMA). Cadastro Nacional de Unidades de Conservação. bit.ly/3ArFlwS. Data de acesso: 14 de março de 2022.
[12] Incra. Projetos de Assentamento Total. bit.ly/3Anl23t. Data de acesso: 19 de outubro de 2022.
[13] Os critérios para construção dessa hierarquia são detalhados em: Freitas, Flávio et al. Malha Fundiária do Brasil. Atlas – A Geografia da Agropecuária Brasileira, 2018. bit.ly/3OsI9zs. Destaca-se que a nota técnica de 2018 é a referência metodológica para a versão de 2021 da Malha Fundiária do Brasil.