Menu
MicrosoftTeams-image-6-scaled
Foto: Cristina Leme Lopes

O Código Florestal de 2012 instituiu dois importantes instrumentos para a gestão, monitoramento e adequação ambiental de imóveis rurais: o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA). A redação original da lei previa prazos específicos tanto para a inscrição das propriedades no CAR quanto para a adesão dos produtores ao PRA. Com o passar dos anos, a implementação desses instrumentos pelos estados se mostrou mais complexa do que o esperado, promovendo movimentos de pressão pelas prorrogações dos prazos.

Em 2019, a Lei nº 13.887 alterou as regras do CAR e do PRA. A lei extinguiu o prazo para a inscrição de imóveis rurais no CAR, tornando-o um cadastro permanente, mas impôs uma data limite de inscrição — 31 de dezembro de 2020 — para os produtores terem o direito de aderir ao PRA. Ao mesmo tempo, essa lei estabeleceu um prazo de até dois anos para a adesão ao PRA, após a inscrição no CAR. Ou seja, o prazo para a adesão ao PRA se esgotaria em 31 de dezembro de 2022.

Passados mais de 10 anos da edição do Código Florestal, apenas 15 estados já regulamentaram efetivamente o PRA, e em apenas sete o programa está implementado.[1] Os motivos na demora para a regulamentação e/ou implementação do PRA pelos estados são variados, incluindo falta de prioridade política para a agenda, problemas no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR) e desafios na implementação das ferramentas tecnológicas para análise dos cadastros e adesão ao PRA.

Diante desse cenário e da proximidade do vencimento do prazo de 31 de dezembro de 2022, houve uma nova proposta de alteração das regras do PRA por meio da Medida Provisória (MP) nº 1.150, de 26 de dezembro de 2022. O relator da MP, Deputado Sergio Souza, apresentou, no dia 28 de março de 2023, o seu primeiro relatório com Projeto de Lei de Conversão (PLV), mantendo a proposta original da MP, mas incluindo também mudanças na data limite de inscrição no CAR para garantir o direito de adesão ao PRA. No dia 29 de março de 2023, o relator apresentou um segundo relatório, modificando parcialmente o primeiro.

O Climate Policy Initiative/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio) analisou o texto dos dois relatórios sobre a MP nº 1.150/2022 e identificou que, caso o primeiro relatório seja aprovado, sem emendas, não haverá prejuízos na implementação do Código Florestal. Por outro lado, o segundo relatório traz insegurança jurídica, e ainda há um elevado risco de mudanças negativas na lei, caso novas emendas sejam apresentadas no plenário.

ALTERAÇÃO NA SISTEMÁTICA DE ADESÃO AO PRA

O texto original da MP nº 1.150/2022 altera o parágrafo segundo do artigo 59 do Código Florestal, prevendo que a adesão ao PRA deve ser requerida pelo proprietário ou possuidor do imóvel rural no prazo de 180 dias, contado da convocação pelo órgão competente.

Essa proposta, mantida pelo relator da MP, em seu primeiro relatório,[2] muda a sistemática original do Código Florestal que colocava o produtor como o protagonista pela regularização ambiental de sua propriedade, devendo ter a iniciativa pela adesão ao PRA. Os prazos legais do CAR e do PRA serviriam como incentivo, já que a perda dos prazos implicaria também a perda dos benefícios para a regularização dos passivos em APP e Reserva Legal, por meio de parâmetros e regras mais flexíveis.

No entanto, não foi isso que ocorreu. Os estados não regulamentaram e implementaram os PRAs, pressionando pela alteração dos prazos. Com a suspensão e/ou alteração dos prazos, os incentivos deixaram de existir. Além disso, na prática, a adesão ao PRA é feita após a finalização da análise dos dados declarados nos cadastros, momento em que o órgão competente convoca o produtor para aderir formalmente ao programa. Portanto, essa mudança na sistemática do PRA não traz prejuízo para a implementação do Código Florestal, uma vez que se adequa à realidade dos estados.

O segundo relatório, proposto pelo Deputado Sergio Souza, acrescenta que a convocação do produtor para aderir ao PRA deve ser realizada após a conclusão da análise e da validação do CAR.[3] O órgão competente só pode convocar o produtor após ter finalizado a análise do cadastro, pois, só assim, poderá identificar se há passivos a serem recuperados no PRA. Além disso, o órgão competente faz simplesmente a análise do CAR, não existe essa etapa de validação do cadastro. Portanto, ao acrescentar essa frase, o segundo relatório usa um termo “validação” que não existe no Código Florestal, abrindo, com isso, brechas para interpretações divergentes e criando um ambiente de insegurança jurídica para a aplicação dessa regra.

Por fim, é importante ressaltar que nem o texto original da MP nº 1.150/2022 nem os relatórios apresentados pelo relator estabelecem sanção caso o produtor rural não faça a adesão ao PRA no prazo de 180 dias após a convocação pelo órgão competente. O não cumprimento do prazo deveria implicar na perda do direito de aderir ao PRA posteriormente. Sem essa sanção, perde-se novamente o incentivo para o cumprimento da lei. Assim, caso essa MP seja convertida em lei, nos termos do PLV do relator, o governo federal e os estados devem regulamentar o procedimento de adesão ao PRA, prevendo sanções pelo descumprimento do prazo, como a suspensão do CAR e a perda do direito de adesão ao PRA.

PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE INSCRIÇÃO NO CAR

O PLV proposto pelo relator, nos dois relatórios apresentados, além de alterar as regras de adesão ao PRA, também altera o parágrafo segundo do artigo 29 do Código Florestal, prorrogando, para 31 de dezembro de 2023, a inscrição de imóveis rurais maiores que quatro módulos fiscais, e para 31 de dezembro de 2024, a inscrição de imóveis menores que quatro módulos fiscais.

De acordo com o relator, a prorrogação do prazo de inscrição no CAR visa atender os pequenos agricultores, em especial dos estados nos quais os órgãos ambientais e a própria população estão em condições menos favoráveis. Dados coletados junto aos estados indicam que pequenos agricultores e povos e comunidades tradicionais ainda precisam de auxílio do poder público para a inscrição no CAR, mas isso não deveria servir de motivo para o relator também ampliar o prazo de inscrição de imóveis médios e grandes. Mudanças constantes nos prazos legais retardam a implementação da lei, desincentivam os produtores e geram expectativas de futuras alterações.


[1] Chiavari, Joana e Cristina L. Lopes. Onde Estamos e Para Onde Vamos na Implementação do Código Florestal: Oportunidades para o Novo Governo Lula. Rio de Janeiro: Climate Policy Initiative, 2022. bit.ly/OndeEstamoseParaOndeVamos.

[2] Poder Executivo. Parecer de Plenário à Medida Provisória Nº 1.150 pela Comissão Mista. Relator Deputado Sérgio Souza. 2022a. bit.ly/3zjSQxJ.

[3] Poder Executivo. Parecer de Plenário à Medida Provisória Nº 1.150 pela Comissão Mista. Relator Deputado Sérgio Souza. 2022b. bit.ly/42PqEQJ.

up

Usamos cookies para personalizar o conteúdo por idioma preferido e para analisar o tráfego do site. Consulte nossa política de privacidade para obter mais informações.